A semana se passou e nada do Níkolas.
Eu estava ficando confusa e preocupada.
Final de semana chegou e eu voltei para o meu inferno pessoal.
Eu estava ali, mas era como se não estivesse. Ninguém parecia me notar, ninguém parecia se importar comigo. Quer dizer, ninguém me notava nem se preocupava, definitivamente.
A imagem do menino da escada me perseguia, juntamente com a vontade de rever meu amigo-calado-do-quarto. E nenhum dos dois nunca aparecia.
Finalmente, na quarta feira, para o fim da minha ansiedade, quando eu cheguei no quarto, depois do almoço para pegar as minhas coisas – eu estava atrasada – eu o vi, finalmente, deitado na cama, de olhos fechados e, pelo que parecia, num sono profundo.
Tentei não fazer barulho para não acordá-lo, embora soubesse que se não fizesse isso ele acabaria se atrasando pra aula.
Eu não me importava com isso. Eu queria ficar ali e esperar a primeira aula do dia passar enquanto eu ficava olhando ali para ele, dormindo, quietinho. Mas eu sabia que se fizesse isso, alguém viria atrás de mim. Ou melhor, iria até o meu verdadeiro quarto e não me acharia. E como o Níkolas também não estaria em sala, eles viriam até o quarto e nos pegariam ali. Ia ser confusão, então, com muita relutância, resolvi chamá-lo:
- Níkolas, Níkolas.
Ele se remexeu e abriu os olhos.
- Ta na hora da aula. Vamos!
Os olhos dele estavam inchados e eu vi que ele tinha chorado.
- Ta tudo bem? – eu perguntei.
Ele ficou calado um tempo e finalmente disse:
- Ta! – se levantou, pegou as coisas e saiu do quarto.
Ele estava estranho e eu vi que ele não tinha sido nada sincero comigo quando disse que estava tudo bem.
Fui para a aula com a minha cabeça longe.
Nunca nada acontecia comigo, então eu sempre tinha capacidade emocional de me concentrar. Agora minha vida estava uma loucura e prestar atenção na aula definitivamente não dava.
Quando voltei pro meu quarto, no fim da aula, ele já estava de novo deitado na cama e dormindo – ou pelo menos fingindo.
Tomei meu banho, voltei para o meu verdadeiro quarto para a contagem e depois, quando eu estava indo dormir, ele finalmente resolveu falar:
- Você esta ocupada?
- Não pra você. – me odiei por ter falado isso.
Nessa hora o menino da escada veio na minha cabeça na hora e eu fiquei um pouco tonta com o a incoerência entre o que eu tinha dito e com o que eu pensava.
Ele pareceu se intimidar com minha resposta e depois de algum tempo, falou:
- Aconteceu uma tragédia. – eu percebia nitidamente na voz dele o quanto dizer aquilo estava sendo difícil. Levantei da minha cama e sentei ao lado dele, na dele.
Num impulso ele segurou a minha mão e eu me senti petrificar.
Não falei nada, esperei ele dizer alguma coisa. Mas ele não disse.
- O que foi? – eu disse tentando reunir na voz toda ternura que existia em algum lugar dentro de mim.
- Meu pai... – ele engoliu seco – sofreu um acidente.
Lágrimas escorriam no rosto dele e eu sabia como era perder um pai. Sabia que estava sendo muito difícil pra ele.
- Ele estava numa construção que estava projetando, quando uma peça de metal desprendeu e o atingiu. Minha mãe esta inconsolável. – eu também sabia o que era ver uma mãe inconsolável.
- Mas o que seu pai faz? – me senti mal por ter perguntando, mas minha curiosidade foi maior.
Ele teve uma certa dificuldade em responder, e eu não entendi o porquê.
- Ele é engenheiro.
Filho de engenheiro numa escola daquela? Que coisa estranha! Ali eu entendi que havia muita coisa na vida dele que eu desconhecia completamente, mas que eu desejava saber. Não era a hora para isso, e então eu fiz a pergunta mais difícil:
- E ele esta bem? – era claro que não estava.
- Não, Lisa. Ele não resistiu e morreu. – e aos prantos ele se encostou no meu ombro. Eu o abracei com uma das mãos, enquanto ele segurava a outra, e fiquei completamente confusa: ele havia me chamado de Lisa – o que ninguém nunca havia feito – e eu fiquei feliz com nosso grau de intimidade, embora estivesse muito triste por ele estar passando por tudo aquilo.
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